Muito além da Cracolândia – Novo Sinai

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31
maio

Muito além da Cracolândia

Quando criança, o que terminava em “lândia” significava um lugar de sonhos realizados, felicidade estampada em olhinhos infantis ao ver xícaras gigantes giratórias e coloridas, “paradas” de soldadinhos de chumbo e personagens de “gibis”, tudo isso a emoldurar o lindo castelo de uma princesa. Contudo, ficava bem distante da “terra” de minha infância caiçara. Não obstante – jamais deixei de ter sonhos, felicidade ou adentrar castelos mágicos – até hoje. 
Talvez por isso quando “lândia” vem associado a uma terrível e devastadora droga formadora de exércitos de morto-vivos na região central paulistana, fico a me perguntar o porquê de termos essa “terra” de ninguém mui perto de nós – a minar sonhos e esperanças de crianças, jovens e adultos.
Sendo tarefa inalcançável decifrar os múltiplos enigmas da alma, permito-me focalizar somente um grãozinho de areia nesse universo não tão fantasioso assim.
E aí chego à Alcoolândia. O território dominado por predadores de gerações e gerações de brasileiros. Não se situa, ademais, em um espaço delimitado. A impressão é que temos é que começa em nossa formação histórico-política de imensos canaviais e outros tantos “ais” e se espraia pela grande mídia de massas – sabia que em 2014 em evento futebolístico internacional tornar-nos-emos a Copa, digo, o Copo do Mundo? 
Constato à vista desarmada que a Alcoolândia entra nos lares incautos logo nas primeiras horas da manhã, em anúncios vendendo sonhos, felicidade, corpos apolíneos para os garotos sorridentes que aparecem ladeados de princesas praianas. O que não se conta de verdade é que os castelos atrás do álcool são de areia movediça e que os monstros do “delirium tremens” existem. Não estão escritas nos gibis as tristes estatísticas dos acidentes de trânsito que fazem jorrar sangue inocente nas noites de ano novo e em praticamente todas as noites de nossa guerra viária. Pouco se diz que a devastação humana trazida pela Alcoolândia é que conduz seus habitantes como zumbis a outras drogas. Drogas? Devo admitir que somente de alguns anos para cá, depois que o império do álcool se alastrou do Oiapoque ao Chuí que se consegue algum espaço para dizer: álcool é droga e mata.
Em alentadora hora mãozinhas vermelhas com o slogan: álcool para menores é proibido (www.alcoolparamenoreseproibido.sp.gov.br) têm se posicionado em lugares estratégicos na Alcoolândia. Oxalá seja o declínio desse reinado do mal. Até nas autopistas somos lembrados que a lei e a vida não tiram férias, que a verdadeira independência para um jovem é um cérebro livre, não conformado com a injustiça à nossa volta. 
Álcool e direção – de um país para o século XXI com ética e cidadania – definitivamente não combinam. Corajosos homens e mulheres têm ouvido o grito dos inocentes e com galhardia tomam para si a dor dos que perderam (ou perderão) dignidade, emprego, família, amigos por causa dessa droga milenar.   
Bem por isso, tramita na mais alta casa de leis do nosso país, projeto de lei que tem por objetivo fazer do álcool o mesmo que se fez acertadamente com o tabaco. Não proibi-lo para maiores – antes restringir a propaganda.  
E em cada pedaço de chão desta terra brasilis que é a melhor “lândia” do mundo, municípios podem editar leis, e.g.: banindo os pontos de venda dessas duas drogas (álcool e tabaco) das proximidades de estabelecimentos de ensino; controlando os horários dos pontos de venda (a imensa maioria das mortes ao volante dá-se nas madrugadas e finais de semana – não nos é dado ignorar que o álcool não está somente nos motores dos carros… sobe como foguete às cabeças dos motoristas); não se permitindo a instalação de bares e similares em novos bairros residenciais; não se permitindo a venda-consumo de álcool em estádios e imediações (mesmo que uma lei perniciosa e casuística possa surgir em sentido oposto, o município é dotado de competência dada pela Carta cidadã para legislar sobre assuntos locais).   
Adiantei no começo dessas singelas reflexões – não se cuida aqui da abordagem multifatorial do uso das drogas e suas causas. Realço que muito das cracolândias de hoje está no que fizemos (ou não – em notória omissão) em relação ao álcool. Temos plenas condições e razões para expurgar a Alcoolândia do mundo real. Pode parecer utopia da terra de Oz. Mas cantava a pequena Dorothy: 

– And the dreams that you dare to… oh, why can’t I? [tradução ad libitum: “E os sonhos que você ousar ter … oh, por que eu não posso? “] 

Guilherme Athayde Ribeiro Franco

2º. Promotor de Justiça de Matão

guilherme@mp.sp.gov.br

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